terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Aline

A viagem pra Recife demorava em média uma hora e trinta minutos, e esse tempo era suficiente pra eu me apaixonar mais ainda pela Branca. Logo que entramos no ônibus a delegação masculina de Minas Gerais, que viajava no mesmo ônibus que a feminina, veio tirar satisfação comigo sobre o que eu estava fazendo lá. Bem, aquilo não foi muito agradável, mas com o técnico do nosso lado eles não causariam muitos problemas. Sentamos nas nossas poltronas e eu fiquei a olhando em silêncio.

- Cuidado pra baba não molhar sua bermuda! – disse a Helen me tirando do transe que eu havia entrado, ela foi pra poltrona atrás da nossa, e botou os fones no ouvido.

- Branca, posso ta fazer uma pergunta? – perguntei virando de frente pra ela.

- Claro que pode, hoje você pode tudo...

- Se você continuar me dando essa moral toda eu acho que esse ônibus vai ficar pequeno pra nós dois... Mas voltando ao que eu queria saber, ér... A Helen... Bem, quando eu briguei com você, eu e ela, a gente ficou, e você continua tratando ela da mesma forma, como se nada tivesse acontecido. O que ela fez não foi uma espécie de traição? Bem, não comigo, mas com a sua amizade?

- Muito pelo contrario meu amor, eu não queria que você soubesse mas já que você perguntou... Eu que pedi a ela que desse em cima de você, melhor alguém que eu conheça e cofie do que qualquer uma dessas piriguetes que estão espalhadas por ai. – disse ela mordendo meus lábios.

- Você tá me dizendo que ela só me deu aquele mole todo, porque você pediu a ela pra fazer isso? – perguntei ainda não acreditando muito naquela história.

- Isso mesmo Claus, ou você achou mesmo que eu trairia a minha amiga, e ainda por cima gostaria de um cara feio feito você? –disse a Helen me surpreendendo, já que eu imaginava que ela estava ouvindo música.

- Não precisa cuspir no prato que comeu só porque a comida não era a que você queria não Helen, - disse rindo – eu sei que eu sou feinho, mas não precisa esculachar não. – disse causando risos nas duas.

- Para com isso Clau, você não é feio, - disse a Branca me dando um beijo a cada frase que dizia. – se você fosse eu nunca tinha olhado pra você, até porque vamos convir que eu tenho um ótimo gosto.

- Nem tanto né? Aquele cara ali na frente é bem feio, na verdade é quase um monstrinho. – disse baixinho apontando pro Vern.

- Não fala assim dele que ele é meu amigo ainda. – disse a Branca fazendo um biquinho que eu adorava.

Depois de esclarecida aquela situação a Helen voltou para o lugar dela, e dessa vez realmente ligou os fones de ouvido. Eu e a Branca ficamos nos beijando, até que ela dormiu no meu colo e eu fiquei admirando o rosto dela, e vários pensamentos me vieram a cabeça.

Como seria Dalí pra frente? Eu não fazia a menor ideia de como eu poderia viver sem ela, sem aquele sorriso, sem aquele olhar, ou seja, sem ela. Alem do que, eu sinceramente não queria viver sem ela, eu me tornara dependente dela, ela tinha me viciado, e era um vicio que eu não tinha como manter. O tempo passou e com ele a distância até o aeroporto também, e quando chegamos eu a acordei com um beijo carinhoso nos lábios.

- Amor, acorda, – disse beijando-a novamente – que nós já chegamos ao aeroporto.

- Mas já? A gente saiu agora a pouco da sua cidade. – O olhar dela naquele momento representava exatamente o que eu estava sentindo, uma lágrima correu pelo olho dela, e eu a enxuguei com o dedo.

- Não fica assim, isso não é uma despedida eterna, é um até logo. – E no momento em que eu terminei de falar uma lágrima me saltou aos olhos, escorreu pela minha bochecha e tocou a testa da Branca.

- Como eu não me sentiria triste Claus, eu posso nunca mais te ver, eu posso passar o resto da minha vida sem saber o que é... – ela parou de falar e as palavras deram lugar às lágrimas que naquele momento nem eu nem ela fazíamos o menor esforço para segurá-las.

- Eu sei o que você está sentindo, eu estou sentindo a mesma coisa, mas nós não podemos deixar de ser otimistas, - disse sem convicção, já que nem eu mesmo acreditava naquilo que eu estava dizendo – quem sabe a gente ainda tem uma chance?

Antes que ela pudesse responder, um homem alto, de meia idade, com os cabelos grisalhos começou a falar na frente do ônibus, eu não tinha visto ele antes, então imaginei que fosse o representante da federação mineira de vôlei. Ele começou a falar algo sobre como seria o embarque da seleção e agradecia pelo vice-campeonato brasileiro que as duas seleções haviam conquistado, ele continuou falando por mais alguns minutos e eu não prestei muita atenção no que ele estava falando.

Logo que o representante, cujo nome era Marcelo, terminou de falar a delegação masculina começou a descer e quando todos já estavam fora do ônibus, o time da Branca esvaziou o ônibus e somente eu e ela ficamos para trás, nós nos olhamos e demos um último beijo, um beijo de despedida. Eu não poderia entrar no aeroporto, pois o meu ônibus saia poucos minutos depois, e era o único que iria para a minha cidade no resto do dia. Assim que nós descemos a Helen e o Deco vieram se despedir de mim.

- Claus, eu vou sentir sua falta, - disse a Helen me abraçando – qualquer dia desses vai lá pra Minas, ai a gente podia combinar de se ver de novo, eu, você a Branca e quem sabe algum amiguinho meu.

- Pode deixar, se eu tiver a oportunidade vou fazer de tudo pra ir ver vocês.

- Cara, me desculpa por qualquer coisa que aconteceu entre a gente, eu só queria proteger minha amiga... Eu achei que você fosse uma má pessoa, me desculpa tá?

- Não tem nada a ver não cara, deixa isso pra lá, a vida segue, mas agora eu tenho que ir gente, se eu ficar mais um minuto aqui vou perder meu ônibus e ai eu só vou ter como voltar pra casa amanhã de manhã.

Eu não me lembro bem o que foi que aconteceu nos momentos que se passaram, e sinceramente nem quero me lembrar. A viagem de volta pra minha cidade foi a mais longa da minha vida, muitas coisas passaram pela minha cabeça, e nenhuma delas realmente se fixou, foi como passar em um túnel de projeções, mas uma passagem tão rápida que não consegui ver nenhuma projeção com perfeição.

Depois de algum tempo de viagem o ônibus parou na minha cidade, e eu desci sozinho para o fim de tarde que me esperava, o mesmo fim de tarde de sempre, sem graça, sem diferença, sem nada pra fazer e sem ela, sem a Branca.

Fiquei parado no ponto de ônibus admirando o pôr-do-sol, e lembrando os últimos dias, os melhores últimos dias de sempre. Eu não sou o tipo de pessoa que gosta de pensar no que passou, mas aquela situação era diferente, por mais que eu tentasse, por mais que eu me esforçasse era impossível esquecer de uma vez, eu não controlava os meus sentimentos, e mesmo que controlasse não iria querer esquecê-la, não daquele jeito.

O sol caiu, e a lua começou a tomar o lugar que a ela cabia no céu, foi então que me lembrei da promessa que tinha feito ao meu irmão, e voltei a realidade, fui pra e quando cheguei ele já estava tomando banho e a Gabbi já estava terminando de se arrumar.

- Achei que não vinha mais, que tivesse ido embora junto com ela, - disse ela meio sem expressão. – você sabe que se fizesse isso mamãe se mataria né?

- É, eu sei, e foi só por esse motivo que eu não fiz ainda.

- Nossa, quer dizer que por mim e pelo CH você já tinha ido embora a muito tempo? – perguntou ela fingindo um falso ressentimento.

- É claro que não sua boba, eu gosto de vocês, tanto quanto gosto da mãe, e deixa de frescura tá? Eu vou lá apressar o CH senão a gente não sai de casa hoje, ainda tenho que tomar banho...

O banheiro, como sempre, estava um calor insuportável, o CH adorava tomar um banho quente e que demorava horas e horas. O espelho e o box já estavam todo embaçados e havia fumaça para todo canto.

- CH?! Você ainda esta vivo ai dentro? – perguntei brincando com ele.

- To sim Claus, e já to saindo, da pra você espera um pouco? – disse ele irritado.

- Eita menino, calma, eu só fiz uma pergunta, não precisa responder com essa grosseria toda não, ta nervoso porque vai encontrar com a Aline ai fica atirando pedras em todo mundo? – disse segurando o riso

- Aline? Quem é Aline? – Eu devia ter fechado a porta antes de falar, se minha mãe imaginasse que o CH estava indo sair com uma garota era capaz de ela surta, o queridinho dela, o caçula, por quem ela tinha mais ciúme, ele nunca teria uma namorada, isso se dependesse dela, mas como não dependia...

- Aline é o nome de uma cadela da amiga da Gabbi, e o CH morre de medo dela. – disse inventando a desculpa mais esfarrapada que eu já tinha feito na minha vida.

- Sei... Claus, e nada de passar a noite fora de casa hoje de novo, nem pense em fazer uma coisa dessas comigo menino, eu acho que tenho um infarto.

- Pode deixar mãe, juro que não vou passar a noite em outro lugar... E CH, da pra você sair de dentro desse banheiro.

- Calma, já to saindo. – disse ele abrindo a porta do box.

- Dez horas dentro do banheiro, nunca vi, parece até que vai casar, meu deus do céu. – disse tirando a roupa para entrar no banho. – E por favor, me dêem licença que eu estou afim de adiantar o serviço que fizeram questão de atrasar.

- Ai meu filho, que besteira, acha que eu nunca te vi pelado? Pare de me olhar com essa cara, já estou indo. – disse ela virando as costas. – Vem, vamos meu filho.

Eu normalmente não tomava banho quente, mas aquela não era uma condição normal, então resolvi mudar um pouco e aproveitar a água caindo sobre a minha cabeça, por incrível que parece, essa é uma das formas mais fáceis de relaxar.

Depois que todos estávamos prontos foi só nos despedir da mãe e ir pra praça, onde nós tínhamos combinado de nos encontrar com as meninas e os meninos com que nós normalmente saiamos. Quando chegamos a Aline e o Gustavo já estavam lá, e se eu não me engano percebi um olhar diferente trocado do meu irmão para a Aline.

Ficamos conversando por algum tempo nos bancos da praça mesmo até que eu tive a ideia de chamar minha irmã e o Gustavo pra ir comprar um refrigerante pra nós, já que pelo que parecia o resto da turma ia demorar um pouco mais para chegar. O Gustavo também gostava da Aline, e não foi fácil o fazerele sair de perto dela, mas com algumas ameaças e um pouco de calma consegui levar pra longe por tempo suficiente pra que alguma coisa acontecesse

- Onde é que nós vamos comprar esse refrigerante? – pergunta Gustavo ansioso pra voltar pra praça.

- Acho que lá no bar do João. – respondi.

- Mas lá num é um pouco longe não, tem a padaria que é bem mais perto.

- A padaria já deve estar fechada a uma hora dessas, - disse disfarçando uma risada.

- Ai Gu, para com isso e vem logo com a gente, que preguiça é essa de andar hein, já estamos quase chegando, e alem do mais, você não tem o que fazer... – disse a Gabbi ficando com raiva daquela discussão sem sentido algum.

- Ta bom, ta bom, já que você ta pedindo eu vou lá, mas e se o pessoal chegar e a gente não tiver lá? – Ele perguntou. Na realidade era mais um pedido do que uma pergunta.

- Eles vão ficar lá esperando com o CH e com a Aline, não? – perguntei fingindo não entender o motivo da pergunta.

- Acho que ninguém mais vai ir à pizzaria com a gente não, - começou a falar a Gabbi. – A Dani disse que ia ter que ficar em casa porque os pais dela não deixaram ela sair, o Thi disse que ia pra Guruanã ver se encontrava um negócio que ele tava procurando e o Beto não confirmou nem negou nada, então acho que não vem.

- E por que você não me contou isso Gabbi? – perguntei adiantando a pergunta que o Gustavo estava para fazer.

- Eu devo ter esquecido, eles me falaram na hora que você foi viajar Claus, e eu não lembrei de te falar.

- Não tem problema não, pelo menos não pra mim, a gente faz a festa só nós cinco mesmo.

Continuamos andando até o bar do João, eu e a Gabbi fomos cantando e o Gu ficou com uma cara de poucos amigos, compramos os refris e quando estávamos voltando pra praça ele falou.

- Gente, eu não estou passando muito bem não, eu acho que vou pra casa, vou aproveitar que já estou aqui perto e vou pra lá. – deu um beijo da Gabbi e apertou a minha mão.

- Melhoras pra você Gu, num fica assim não. – disse a Gabbi tentando consolá-lo.

- Falou moleque, até amanhã. – disse eu com um aceno de mão.

- Até.

Eu e a Gabbi continuamos andando e quando ele já estava um pouco mais para trás de nós eu comentei.

- O Gu anda meio estranho ultimamente, ele já gostou da Dany, da Fe, e agora ta gostando da Aline também, por que ele não se decide por uma de vez?

- É não é? Tanta gente dando bola pra ele e ele fica ai sofrendo por quem não quer nada com ele, vai entender uma coisa dessas!

- Também não entendo isso nele. A Fe é uma pessoa legal, além de ser bonita e talz. – disse sem perceber na cara que a Gabbi fazia.

- É verdade, as vezes eu acho que ele não merece é ninguém, isso sim!

- Vamos falar de outra coisa né? Vamos volta a cantar? – disse puxando o refrão de uma musica que a Gabbi tinha composto pra nossa banda.

Continuamos andando até a praça, e quando chegamos ficamos meio constrangidos de atrapalhar o que estava acontecendo entre a Aline e o CH, e decidimos dar umas voltas pela praça e ver o que acontecia.

A chuva começava a enfraquecer lentamente, mas nem de perto o sol ameaçava sair, as nuvens cobriam todo o céu e a escuridão ainda dominava as ruas, a água do rio corria mais apresada do que nunca, e as gotas da chuva pesavam minha roupa cada vez mais, aumentando o peso que eu carregava nas costas, o peso de todos os meus sentimentos desmoronando sobre mim.


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Desculpa gente, eu sei que eu demorei um pouquinho pra postar né (na verdade foi muito mas ta blz), é que eu não ia mais escrever mas resolvi voltar, Espero que gostem e... COMENTEM! RUM